sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Luciana Scotti ficou muda e tetraplégica por causa da doença mas diz não ter parado no tempo. “Ser forte foi minha única opção”

Aos 22 anos, Luciana Scotti sobreviveu à doença que mais mata as mulheres no País. Não entrou para os 49 mil casos de mortes femininas anuais por acidente vascular cerebral (AVC), mas aos 40 faz parte dos 400 mil brasileiros que todos os anos passam a carregar as sequelas físicas e psicológicas deste problema de saúde.
Ao abrir os olhos no hospital em São Paulo – após três meses de inconsciência – Luciana estava muda, sem os movimentos de braços e pernas e com dificuldade para engolir e respirar. Estava também mergulhada na angústia de não poder falar sobre o que fazer com a promissora carreira de farmacêutica, com o namoro recém começado e com os planos de conhecer o mundo só com uma mochila nas costas.
Siba mais sobre o AVC
Com o movimento que restou apenas no dedo médio da mão esquerda, ela – que era a mais bonita da turma da USP, diziam os colegas – descobriu que palavra escrita pode ser gritada, chorada ou sussurrada. Escreveu em 1997, com todas estas entonações que cabem nas letras, o livro “Sem asas ao amanhecer” (Ed. Nome da Rosa).
A publicação chega em 2012 na 11ª edição, dezoito anos depois do AVC de Luciana. O título, reconhece a autora, perdeu um pouco do sentido: com o mesmo dedo médio que desabafou a revolta e a superação em letras, Luciana Scotti voou longe.
Doença sem cura: Karine Barcelos diz viver sem contar o tempo
Aprendeu a escrever em inglês, espanhol e italiano. Em 2002, terminou o mestrado na USP, seis anos depois concluiu o doutorado e virou referência nacional em modelagem molecular (técnica usada na biologia e no tratamnto de doenças). Há cinco anos, terminou o pós-doutorado na Universidade Federal da Paraíba, Estado onde mora. Só este ano, o mesmo dedo assinou 10 produções bibliográficas. Ela dá aulas, é revisora científica e elabora palestras virtuais.
A fisioterapia e a ginástica intensa também renderam maior sustentação do dorso, melhor mobilidade no braço esquerdo, controle do fôlego e "gás" na autoestima. Pela internet, Luciana Scotti conheceu amores, desmanchou namoros e noivados, fez amigos, escreveu sobre saudades. A piscina, a praia e a cervejinha eventual – tomada de canudo – são os hobbies preferidos, além da leitura, do cinema e da música.
Único caminho
O AVC precoce que cruzou e moldou o caminho da farmacêutica responde por um em cada dez casos no País, segundo estudo inédito da rede Brasil AVC. Em mulheres com menos de 30 anos, amistura entre cigarro e pílula anticoncepcional é o fator mais associado à doença.
“Estamos muito preocupados com a antecipação dos AVCs nas pacientes, um fenômeno mundial”, alerta a neurologista da Rede Brasil, Scheila Ouriques.
“As jovens estão mais obesas, mais hipertensas, mais estressadas, e tudo isso é gatilho para o AVC”.

Nenhum comentário: